A segunda pele, na terceira idade
Se a roupa é considerada nossa pele adicional, a nova geração platinada tem muito a vivenciar. Foco no gosto pessoal e a necessidade de se autodescobrir são movimentos fundamentais. Isso vale tanto para o traje que compõe o dia a dia, quanto aquele usado em situações especiais. Suely Tonarque é gerontóloga, com mestrado na PUC, especialista em moda no envelhecer é defensora incansável de que, após os 60, é preciso vestir-se com alma. Também recomenda, manter-se fiel ao estilo próprio, que é a maneira de cada um se apresentar ao mundo exterior.
Quando o assunto é moda e comportamento em relação ao vestuário, é comum surgir a polêmica sobre o permitido, recomendável, prático e confortável a homens e mulheres, que se encontram na fase madura da vida. Para Suely Tonarque, hoje com 72 anos, uma paulista natural de Rancharia que veio para capital aos 20 anos de idade, “moda é vida, é resgatar a relação com o corpo e com a passagem do tempo”. E a especialista, que é psicóloga, pedagoga e influencer, tem uma particularidade: encara o tema com leveza e humor. Em suas frequentes palestras, convida os presentes a revisitarem a maneira como se relacionam com o corpo, silhueta, cores e texturas que se adaptam à fase do envelhecimento.
A abordagem, quando a pauta é moda, também permeia os preconceitos que rondam o jeito de ser e de agir da pessoa idosa. Uma pergunta recorrente na forma de interpretar o tema, para a faixa etária acima dos 50/60 anos, no entender de Tonarque, é: “o que se procura ao escolher o traje que envolve o corpo, o bem maior que precisa ser cuidado”? E a resposta vem na sequência à indagação. De acordo com ela, a escolha é vestir-se com amorosidade, colocar uma roupa e sentir a harmonia que ela proporciona. “Essa é a melhor mensagem que podemos transmitir aos grupos sociais que frequentamos”, ensina.
Para atenuar a complexidade que teima em cercar a escolha da pessoa idosa diante do guarda-roupa ideal, ela reconhece que, depois de muitos estudos sobre o assunto, veio a compreensão de que a decisão vai muito além de eleger um estilo ou acompanhar tendências. “Eu uso um vestido de tafetá à luz do dia com um tênis e vou à uma reunião em meu escritório, como também tomar café na padaria da esquina”, exemplifica sobre a liberdade de definir o que e quando usar uma determinada roupa. “O cotidiano é a nossa festa!”, sentencia a influencer que também é autora do livro: “Vestir com os desafios do envelhecimento”.
Familiarizada desde cedo com o terreno da moda, conta que, na infância, participava de desfiles no clube local, incentivada pela mãe, que contratava costureira especialmente para elaborar os trajes dela e de outras duas irmãs.
Singularidade
Para a especialista em roupa para longevos, a modelagem não é uma prerrogativa, “cada ser é único e com história própria”. Relata que na confecção de trajes femininos que pertence à sua irmã há uma prática, a do tamanho único, que se adapta ao manequim da compradora. Os recursos para essa adequação são os da própria arte da costura, como uma pense, barra etc. ou o uso de acessórios como cintos, coletes, camiseta ou segunda pele, entre outros. “O objetivo é acolher o corpo que está em processo de envelhecimento”, considera
No entender de Tonarque, a singularidade e a modelagem que tornam mais exclusivo o vestir é tão importante para o equilíbrio na terceira idade quanto outras necessidades como a busca da espiritualidade, o exercício físico, a comida e o plano financeiro. Os imperativos da moda são rejeitados pela estudiosa do assunto, para quem nenhuma grife internacional pode ser capaz de ditar o que e quando a mulher madura vai usar esta ou aquela roupa. Ela também se junta ao grupo contrário aos procedimentos estéticos. “Cada ruga, cada sinal, cada sobra de pele no braço tem histórico e conteúdo, porque registra momentos atravessados ao longo da vida”, defende.
Elementos que definem o vestir com personalidade:
– Roupa única, aquela que não vai ter nada similar em loja de shopping
– Exclusividade também nos detalhes
– Traje confortável e que promova bem-estar
– Valorização de cores sólidas e evitar o abuso de estampas muito coloridas ou animal print
– Usar legging ou qualquer tipo de calça justa com sobreposições, para privilegiar a composição mais favorável do traje
– Calçado confortável e seguro
– Uso adequado do moletom que valorize a silhueta, sem restrição do respectivo traje.
Há cerca de quatro anos, Suely Tonarque abandonou a tintura do cabelo e se sente em paz com seus fios grisalhos. Considera que, quando a pessoa constrói seu estilo, se concilia com o que vê no espelho, não há o que retroceder. O avanço vem dessa construção e autoaceitação, no entender da entusiasta da moda para a maturidade.
Fotos: Acervo pessoal