Em busca de cartas perdidas

Suely Tonarque

Querido Presidente Nixon,

Eu soube que o senhor está com pneumonia. Saí do hospital ontem e estava com pneumonia e espero que o senhor não tenha pegado pneumonia de mim. Agora o senhor tem que ser um bom menino e tem que comer a verdura, assim como eu tive! Se o senhor tomar o remédio e as injeções vai sair em oito dias, como eu.

Com amor, John W. James III – 8 anos.

Carta 023

Coma a verdura!

De: John W. James III

Para: o Presidente dos Estados Unidos, Richard Nixon

12 de julho de 1973

Julho de 1973 não foi o melhor dos meses para o presidente Richard Nixon. O escândalo de Watergate, que acabaria por custar-lhe o cargo, ganhava força com a revelação de que conversações ocorridas no Salão Oval haviam sido gravadas secretamente – mais uma reviravolta numa história nebulosa que já prendia a atenção de milhões de pessoas. Em meados do mês, a pneumonia entrou em cena, e um Nixon enfraquecido, restrito à cama do hospital, teve de assistir às audiências pela televisão, sem poder fazer nada.

Ainda bem que recebeu o apoio de John W. James III – um solidário menino de 8 anos. A carta encantadora chegou às suas mãos durante sua recuperação e o divertiu a tal ponto que, ao voltar para a Casa Branca, ele a leu em voz alta para os seus assessores.

As cartas eram esperadas com ansiedade, as noticias chegavam de outros países, cidades, lugarejos – às vezes demoravam; a espera do carteiro todos os dias dava esperança das notícias; cartas de amor, de amigos, de parentes, todas recebidas com alegria, às vezes com tristeza da morte do tio-avô, da amiguinha ou até mesmo de um animal de estimação. As cartas existiam e eram esperadas com pulinhos, antes de serem abertas; a primeira coisa lida era o remetente.

Carta da minha mãe (Zilda) para o meu pai (Albertino) em sua viagem inesquecível – 16/03/1996.

Querido Albertino,

Chego em Roma ao amanhecer com o espetáculo do sol nascendo, vejo da janela do avião, Suely dorme. Desço no aeroporto “Leonardo da Vinci”, tomo um café e, em seguida, voamos para a Turquia. Queria muito que você estivesse junto para conhecer todas as igrejas, castelos, museus, restaurantes. Aqui é frio e agradeço a Deus por essa benção de estar vendo coisas bonitas. Amanhã vou pedir para a Suely pôr no correio e depois escrevo mais novidades.

“Abraços”
Zilda Pires da Silveira Tonarque

PS: Não vejo a hora de chegar em Israel.

Nas décadas de 1950, 1960, 1970 e 1980 não tínhamos essa forma de comunicação rápida – vapt-vupt –mensagem enviada, recebida, respondida, bloqueada, informações do mundo, às vezes das tristezas das guerras, nos deixando apreensivos. Os aplicativos em ação – whats, startups, insta, face, tik-tok, SMS (eu não sei mais e não consigo acompanhar as n’s mudanças): uma invasão de informações.

Tenho saudades das cartas (sou antiga e ultrapassada). Às vezes, sinto uma desacomodação interior ao ser invadida por tantas informações do mundo atual; primeiro, não dou conta de ler tudo; segundo, pelos fakes; terceiro, o tempo é curto (meu prazo de validade também). Às vezes me dá vontade de escrever cartas só para ir até o correio. É divertido fazer uma letra bonita, prestar atenção para escrever o nome da rua e o número da casa, conferir o CEP, verificar se o nome do remetente está correto e aguardar a resposta.

Tudo guardado na caixa da memória, tempo inesquecível! O meio de comunicação avançado.

Vamos seguindo o viver e acompanhar as mudanças.

Canta, canta minha gente

Deixa a tristeza pra lá

Canta forte, canta alto

Que a vida vai melhorar…

Canta, canta minha gente (Martinho da Vila)

OBs.: 1- Primeira carta extraída do livro “Cartas Extraordinárias” – correspondência inesquecível de pessoas notáveis – Editora Cia. das Letras (presente de aniversário de Regina Dias e Dulce Ferreira – muito obrigada1).  2- Carta da minha mãe para o meu pai.

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