O CORPO NA VELHICE NÃO PRECISA SER NECESSARIAMENTE INSIGNIFICANTE E DOLORIDO

Suely Tonarque

Por Suely Tonarque (*)

Meu mundo, minha moeda

Meu corpo, minha regra:

Porque a vida só vale se agrega

0 valor e a condição que me cabem:

Ser quem decide molde e cor da roupagem

 

meu corpo, minha regra:

porque a vida só vale a entrega

quando vestido o que trago na bagagem:

nada às escondidas na hora da triagem

 

meu corpo, minha regra:

porque a vida só vale a quimera

daquilo que me alimenta de coragem:

seja eu o espelho da minha real imagem

(Paulo Sabino – 2018)

 

Algumas canções da nossa Música Popular Brasileira também falam sobre o envelhecimento. Vejamos a beleza das palavras e da sonoridade de: “A sua palavra de força, de fé e de carinho, me dá a certeza de que eu nunca estive sozinho” (autores: Roberto Carlos e Erasmo Carlos).

Muito significativa também “Amigo é coisa pra se guardar, do lado esquerdo do peito” (Milton Nascimento e Fernando Brant). Conquistar amigos, construir relações e mantê-las são fatores importantes para o nosso bem-estar, o contato afetuoso se compara aos nossos alimentos que conservam a saúde, e alimentos psíquicos no encontro com nossos colegas para trocar ideias, dar risadas, chorar, ir ao cinema, entre outros passatempos.

E tudo isso nos encaminhando à liberação de 0citocina ou o hormônio do amor, que traz para o ser humano a sensação de bem-estar e conforto.

Quero, com tudo isso, oferecer aos meus leitores mensais, o testemunho de que o nosso corpo vai se transformando durante a existência, temos limitações difíceis de suplantar, mas necessariamente a velhice não transforma nosso corpo em algo insignificante e dolorido. O nosso psiquismo, nosso espírito, nossa alma (como quisermos chamar) pode preservar a alegria de viver, a valorização do aprender, e a capacidade de amar.

Regina Sumiko Habara ganhou de presente de aniversário de 80 anos de sua filha Silvia, o livro “Vestir com os Desafios do Envelhecimento” (livro de minha autoria) e ao terminar a leitura do livro me escreve:

“Bom dia Suely…

Acabei de ler o seu livro. Ele não é daqueles que você lê, termina e pronto.

Não!!!… você tem vontade de ler, folhear novamente.

Ler seu livro me levou a fazer uma incursão na memória e uma na minha vida pessoal e profissional!

Desde criança fazia parte do meu universo: agulha, linhas, tesouras, babados e rendas, ajudando minha mãe costureira. Sou formada professora de Economia Doméstica e de trabalhos manuais, na antiga Escola Industrial Carlos de Campos, fundada no início do século XX no Brás… uma escola de qualificação profissional e vocacional, essencialmente feminina de horário integral, com aulas teóricas fundamentais e práticas de artes e ofícios.

Especializei-me em técnica de confecção de flores, bolsas, chapéus e ornamentos. Com base nesses estudos, a vida me ensinou o resto… costurar, cortar, modelar. Criar.

Como professora do ensino fundamental, vesti minhas pequenas alunas com roupas de papel crepom para apresentações em festinhas escolares.

Quando minha filha nasceu, eu brincava de boneca fazendo-lhes vestidinhos cheios de babados, flores e laços. Quando a vida nos mostrou (uma realidade crua e nua) isto é, o lado financeiro difícil, fui trabalhar em uma confecção especializada em roupas de festas (chamada de vanguarda), aprendi o duro e verdadeiro desafio da moda…, lidar com clientes e até ajudar com clientes de moda na antiga FENIT.

Por muitos anos vi minhas roupas, dançando nos festivais de fim de ano da Escola de Ballet Silvia Koesling.

Vi minhas roupas dançando valsas em bailes de formatura. Também vi minhas roupinhas em crianças batizadas. Vi daminhas, madrinhas, mães de noivas, vestidas com minhas roupas em cortejos nos corredores de igrejas.

Vi noivas subindo ao altar, orgulhosas e felizes realizando o sonho de toda a mulher …. o vestido de noiva. Foram mais de 50 anos, destinados ao Vestir. Vestir o Corpo, a Mente e a Alma.

Vestir a Mente, ensinando minhas ajudantes, técnicas do ofício, a qualidade, bordados e acabamentos, modelagens perfeitas que eram muito exigidas na época…

Vestir o corpo, transformar um monte de tecidos: tules, rendas e bordados em rima para colorir o corpo em momentos especiais.

Vestir a alma é ver refletido no espelho o sorriso de satisfação e felicidade da mulher, para ela mesma diante da magia do sonho realizado.

Farei 80 anos agora em novembro…

Mais uma vez, Escorpião renasce das cinzas, diante do mundo, inovações tecnológicas, era digital, vou envelhecendo… Envelhecer, vivendo a plenitude da juventude da velhice… e o prazer de viver!

Na sua desconstrução (no livro), você mencionava que a reflexão sobre a Velhice não tem uma conclusão…, e não tem mesmo.

No seu livro você cita Mário Quintana, um dos meus poetas preferidos, interpretando o que ele escreve em “O Tempo”. O tempo passa rápido… não quero que seja tarde demais, não vou deixar de fazer o que gosto, de não ter medo de ser feliz.

O tempo vai… não volta mais

Por isso quero viver imensamente cada momento sempre com bom senso, bom gosto e bom viver. Pois então a uma vida é transformação, com a idade as rugas chegam, o cansaço, o enfraquecimento, as dores. As limitações. A finitude, a vida é como uma novela…. acaba no fim.

Vou então aceitar meus últimos capítulos, vestindo com os desafios do Envelhecimento, aceitando o meu corpo antigo, relembrando os bons momentos que a vida me proporcionou.

Colorir a vida e ter a liberdade de escolhas.

Obrigada

É um prazer ler o seu livro… tão grande o prazer que tenho vontade de dar á algumas amigas, esse mesmo prazer….

Parabéns, mais uma vez.”

Eu recebi este depoimento/ testemunho da Regina e fiquei encantada: “pronto vou postar”, pois mostra a riqueza do seu Viver.

Conheci sua filha Silvia Habara (arquiteta) no Espaço Longeviver, no Evento Portas Abertas, no dia 24 de setembro. O espaço Longeviver é um ambiente voltado para encontros, cursos com vários temas relacionados ao Envelhecimento. Não deixem de visitar!

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